Eleito entre as 100 personalidades mais influentes do agronegócio em 2018, Arlindo de Azevedo Moura nos recebe em sua sala de reuniões, no bairro Pinheiros, em São Paulo, com a simplicidade adquirida somente por quem já viveu (e fez) muito. Ocupando uma entre as cinco cadeiras do Conselheiro de Administração da Sementes Jotabasso, o atual presidente da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (ABRAPA), conta que aceitou o convite, também, para conhecer e entender ainda mais do setor de sementes de soja. E é com esta mesma clareza e humildade, que nesta primeira edição do Jotabasso Entrevista, Arlindo conversa sobre importantes assuntos do agronegócio, desde a nomeação da nova ministra da Agricultura, Tereza Cristina até perspectivas para o futuro do mercado de sementes. Dividida em duas partes, nosso entrevistado manifesta seu pensamento a respeito de assuntos polêmicos, como tabelamento de fretes e sementes salvas.
JB: Para iniciar esta entrevista gostaríamos de começar falando sobre sua formação e como aconteceu o ingresso do senhor no mundo do agronegócio?
Minha formação é em Administração de Empresas com mestrado em Finanças e, na verdade, a minha entrada no agronegócio foi meio casual.
Eu trabalhava em São Paulo, numa empresa metalúrgica, e recebi um convite para ser presidente da Kepler Weber lá em meados dos anos 1980, e depois disso fiquei no agronegócio. Mais tarde, após 10 anos, sai da Kepler Weber, que é armazenagem, aceitei um convite para assumir a John Deere, de máquinas agrícolas, onde fui responsável pelos negócios na América do Sul.
Dez anos mais tarde recebi outro convite para estruturar e organizar a área agrícola da SLC Agrícola. Cheguei lá em 2004, abrimos o capital dessa empresa em 2007, por R$ 14,00 a ação. No ano seguinte, foi feito um aumento no capital a R$ 28 a ação. Foi um sucesso muito grande. A empresa cresceu rápido, sendo hoje um modelo para o Brasil e para o mundo.
Depois disso, fui convidado para um outro desafio onde passei atuar com um Grupo de Investidores, criado para comprar companhias. Então esse Grupo acabou comprando a Maeda, a Vanguarda e a Brasil Ecodisel. A partir da fusão dessas três empresas nasceu a Terra Santa. O meu contrato teve duração de cinco anos e quando encerrou eu não quis renovar minha permanência e, desde primeiro de maio de 2018, assumi outro desafio: que é a Santa Colomba, onde pretendemos desenvolver um projeto muito desafiador também.
É uma empresa de 130 mil hectares de áreas próprias, que estamos começando a desenvolver. Hoje já temos 16 mil hectares de área plantada, sendo um projeto 100% irrigado, onde imaginamos chegar a uns 200 pivôs de irrigação, temos culturas como café, cacau, banana, algodão, tabaco, soja, milho e estamos analisando o lúpulo. É um projeto bem interessante e diversificado, mas espero que seja meu último projeto (risos).
Todas as empresas, exceto a última, eu fiquei sempre em torno de 10 anos. Na Terra Santa foi uma opção de ficar os cinco anos e passar para o Conselho de Administração, e aqui na Santa Colomba entrei como sócio do projeto.
JB: O senhor que já esteve no comando de grandes empresas do setor agrícola brasileiro em diferentes cenários políticos, qual sua expectativa para a partir de 2019, com o novo presidente e a nova ministra da Agricultura?
As empresas agrícolas foram muito bem nos últimos dois anos, o agronegócio como um todo foi bem, apesar do Brasil não estar bem. E a expectativa que se tem hoje, não só do agronegócio, mas de todo Brasil é de uma esperança muito grande. A gente percebe conversando com as pessoas e com os próprios empresários um entusiasmo em função do novo presidente. Eu também estou otimista. Acredito que teremos uma nova forma de gestão. Eu rodo pelo mundo e ainda ouço falar muito do lado negativo do Brasil como a corrupção, por exemplo. E o novo presidente é bem ao contrário, não existe nada que desabone ele. Então, acredito que o Brasil deva encontrar uma nova forma de gestão.
Como presido a ABRAPA, acompanhei a criação do Instituto Pensar, que congrega cerca de 130 deputados e outros 10 ou 12 senadores, em torno de 140 pessoas. O objetivo desse Instituto é fornecer informações e dados para embasar novos projetos e leis. A partir disso, o Instituto Pensar deu origem a Frente Parlamentar de Agricultura. Hoje não é só a ABRAPA que está dentro desse Instituto, são mais de 40 associações que contribuem e participam. Então! Foi essa Frente Parlamentar que indicou a Tereza Cristina para assumir a pasta de ministra da Agricultura. Na verdade, indicamos dois, a Tereza Cristina acabou sendo a escolhida.
JB: Quais são os principais gargalos que o agronegócio brasileiro ainda precisa superar e como o senhor viu a aplicação da tabela do frete?
O Brasil é o primeiro na produção de uma série de produtos. No entanto, ainda temos gargalos muito grandes, sendo o maior deles a infraestrutura. Quando falo em infraestrutura estou falando em portos, estradas e agora temos essa tabela do frete que realmente complicou muito. Essa tabela de preço é inviável. É o mercado que tem que definir o preço do frete. O produtor sempre soube que quando o frete é baixo ele paga menos e quando a demanda é maior ele paga mais. Sempre foi assim. Na época de safra o frete sempre foi bem mais caro e quando tem mais caminhão disponível paga-se menos.
Outra coisa, há décadas existe uma característica que na época de levar a soja para os portos, os caminhões voltavam com os fertilizantes, o que ficou conhecido como frete de retorno, que tinha um valor que servia praticamente pra cobrir o combustível, o pedágio e mais alguma coisa, porque ele (caminhoneiro) ganhava levando a soja. Mas com essa tabela acabou o frete de retorno. A tabela vale pra ida e vale pra volta. Com isso, o frete de retorno dobrou de preço do dia pra noite. Precisamos tornar essa tabela inconstitucional. O frete hoje já é caro, com essa tabela ficou insuportável.
JB: Segundo a Abrasem, o mercado de sementes movimenta R$ 10 bilhões ao ano no Brasil e o mercado cresceu 122% nos últimos 10 anos. Como o senhor avalia esses números e qual seria o maior desafio para que esse setor siga em expansão?
O Brasil sempre teve uma cultura muito forte de salvar sementes. É histórico isso. Mas nos últimos 10 anos, aproximadamente, essa cultura passou a mudar. Por exemplo, a Jotabasso não salva sementes, a Terra Santa, onde fiquei mais de cinco anos, não salva sementes, a SLC Agrícola também não salva. São empresas de sucesso. Penso que essa nova cultura tem que ser levada ao produtor. Ele salva e na hora de plantar, se a semente estiver com um fator de germinação baixo ele acaba plantando porque a semente é dele, mas aí não colhe bem. Já se você comprar de uma empresa do nível da Jotabasso, onde o nível de germinação é alto e garantido, que armazenou essas sementes em armazém refrigerados, coisa que a maioria dos produtores não dispõe. Mas acredito que essa cultura já vem mudando. E vai mudar ainda mais a medida que tivermos mais empresas oferecendo alto valor agregado na semente essa cultura vai sendo corrigida. Acho que sementeiro é sementeiro e produtor é produtor. Não pode misturar. Ele paga um pouco mais pela semente, é verdade, mas certamente o seu retorno em produtividade será mais alto.